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O design como aliado em tempos de pandemia

Disciplinas da Pós-Graduação em Design de Interação exploram soluções na área com a criação de produtos digitais

Internet, computadores pessoais, telefones celulares, música e entretenimento por streaming, transporte e entrega de alimentos por aplicativos, se já estávamos cercados pelas tecnologias de comunicação, a pandemia da covid-19 gerou uma imersão ainda maior nesse mundo digital. O distanciamento social tirou uma parcela grande de pessoas das ruas e as colocou atrás de uma tela, seja do computador e da TV, seja do celular. Nesse cenário, proporcionar uma boa experiência para o usuário quando ele está usando um produto digital – como um site ou um aplicativo – é fundamental. E mais do que isso, novos produtos podem ajudar a superar problemas que surgiram com a pandemia. Como minimizar a queda da renda dos autônomos que não podem trabalhar? Como diminuir a sensação de isolamento e aproveitar melhor o tempo ocioso? Essas foram algumas questões que alunos da Especialização em Design de Interação da PUC-Campinas tiveram que responder.
Em projetos digitais baseados em design UX, a experiência do usuário guia todo o processo de construção do produto. Por isso, é fundamental conhecer esse usuário, suas necessidades e desejos. E a pandemia trouxe novas necessidades. Assim, a criação de produtos digitais tem que levar isso em conta. Oferecida desde 2019, a especialização tem como objetivo introduzir e aprofundar conceitos e técnicas para o desenvolvimento de projetos de Experiência do Usuário (UX) e Design de Interface (UI). De acordo com o coordenador do curso, o professor Tomas Sniker, o profissional dessa área se dedica a entender como as pessoas pensam, suas necessidades e desejos. “A partir dessas informações eles poderão desenvolver sistemas mais adequados, como aplicativos acessíveis a determinado público, sites com aparência atraente para envolver o usuário etc.”, explica.
Uma das disciplinas do curso é “Projeto Integrado UX”, que abrange o processo de criação de projeto digital completo, com ênfase em “user experience”, isto é, na experiência do usuário. “Definimos o tema da pandemia para atividades da disciplina como uma oportunidade para compreender a diversidade de experiências em relação à covid-19 e de explorar possíveis respostas que os designers podem propor neste contexto”, contou a professora dessa disciplina Rosana Vasques. O ponto de partida, segundo ela, foi um artigo do pesquisador da área de design de interação, Peter Dalsgaard, professor da Aarhus University (Dinamarca), sobre como pesquisadores e especialistas em interação homem-computador e design de interação podem contribuir em meio à crise da covid-19. “Utilizando o processo de design thinking (empatia, definição, ideação, prototipagem e teste) e ferramentas específicas de UX, os alunos mergulharam no entendimento do problema, entrevistando pessoas que foram afetadas pela covid-19 e com o uso de sondagens culturais (cultural probes). Depois partimos para a definição do problema específico, seguido da criação de alternativas e prototipagem por meio de softwares digitais, testes com familiares e conhecidos”, explicou Rosana. “Os alunos reagiram positivamente à proposta, as equipes entregaram projetos muito bons, mesmo tendo que trabalhar exclusivamente no ambiente remoto, um dos grandes desafios que profissionais do design enfrentam atualmente”, disse a professora.
Um dos problemas identificados pelos alunos foi a recorrência de sentimentos de solidão por conta do distanciamento social. Um dos grupos de trabalho idealizou o aplicativo “Book Benders”, em que as pessoas podem interagir, discutir e propor leituras umas para as outras. A proposta surgiu a partir de entrevistas que identificaram pessoas que gostam de ler, têm tempo livre e gostariam de conversar com pessoas com gostos em comum.
Partindo do mesmo desafio, de amenizar sentimentos de solidão e isolamento, outra equipe compreendeu que as pessoas sentiam necessidade de sair de casa para realizar atividades cotidianas e, por isso, angustiavam-se com o risco a que estavam expostas. A solução foi criar um plugin para o Google Maps que
apresenta o nível de ocupação dos estabelecimentos, sem prejudicar a segurança daqueles que fornecem os dados por meio do GPS do celular. Desse modo, eles podem planejar seus deslocamentos, reduzindo o risco de exposição ao coronavírus.
“É fundamental conectar os exercícios projetuais e o conteúdo das disciplinas com os temas presentes no nosso contexto social, cultural, ambiental e econômico. Estamos vivendo essa situação de pandemia agora, que nos restringe de muitas formas e que transformou, em pouquíssimo tempo, nossas relações sociais e nossas interações com grande parte dos produtos e serviços públicos e privados”, lembrou Rosana. Um dos setores que teve grande impacto foram as escolas. Pensando nisso, uma das equipes desenvolveu o “My Class”, cuja proposta é minimizar as dificuldades de alunos e professores em aulas on-line. A proposta foi criar uma plataforma virtual mais amigável para professores e alunos, que gerasse mais engajamento ao longo do processo de ensino e aprendizagem.
Em outra disciplina do curso de especialização, “Game, Design e Gamificação”, os alunos também tiveram a chance de trabalhar com o tema da pandemia. A teoria da gamificação aplica técnicas dos jogos no design dos sites, aplicativos e outros produtos digitais. Ela parte da constatação de que o ser humano é atraído por jogos e que eles geram engajamento, compromisso e recompensa para os usuários. Aplicativos que recompensam usuários com pontos que eles podem trocar por produtos são baseados em gamificação. Mas como isso pode ajudar a lidar com a pandemia?
Os alunos Tulio Pulgrossi, Alexandre Tanaka, Rodrigo Miyasaki, Patrice Cáceres, Eduardo Curti e Guilherme de Almeida criaram um aplicativo gamificado para incentivar negócios locais. Nele, o usuário ganha pontos à medida que consome em estabelecimentos previamente cadastrados. “O objetivo é aquecer a economia local em meio ao distanciamento social imposto pela pandemia”, contou Guilherme. Entre as estratégias de gamificação adotadas estão a possibilidade de acumular pontos para trocar por descontos; fazer parte de um ranking da vizinhança, ganhar visibilidade entre os usuários e cumprir tarefas pré-estabelecidas para ter bônus extras. “O aplicativo viabiliza o desejo das pessoas que querem comprar localmente, conectando o comerciante do bairro ao potencial comprador e, ao mesmo tempo, incentiva esse consumidor a optar pelo comércio local por meio de pontos e vantagens”, explicou.
As técnicas de gamificação aliadas ao design também podem ser aplicadas para melhorar a comunicação. “A pandemia trouxe inúmeros desafios e um deles sem dúvida é a própria comunicação sobre o vírus, formas de contaminação e sobre as medidas de isolamento. Ela tem que ser simples e gerar engajamento”, explicou a professora Julia Stateri. “Nesse sentido, a gamificação é muito útil por propiciar mudanças de comportamento”, acrescentou. Ela propôs que os alunos analisassem canais oficiais de comunicação sobre a covid-19. Um deles é o aplicativo do SUS, criado pelo Ministério da Saúde para informar a população sobre o coronavírus, sintomas da doença, formas de prevenção e ainda com uma área de notícias e alertas sobre fake news.
O aluno Guilherme de Almeida concluiu que, no aspecto das fake news, o aplicativo do SUS falha nessa comunicação, porque traz apenas informações oficiais do Ministério da Saúde, sem comparar ou rebater notícias falsas. “É uma abordagem muito passiva, que não gera engajamento do usuário”, acredita Guilherme. Buscando estratégias para melhorar a comunicação, esse grupo de trabalho propôs um “quiz” chamado “Caça Fake”, em que o usuário compara notícias verdadeiras e falsas, gerando uma pontuação. O objetivo é educar o público de uma maneira lúdica, gerar maior engajamento com o aplicativo e explorar as conexões sociais do usuário para espalhar notícias verdadeiras quando ele compartilha sua pontuação. Além disso, a partir das respostas é possível conhecer as crenças do público e identificar as fontes de notícias falsas de maior alcance.
“Existe uma banalização do termo “design” que o remete a artigos de luxo. No sentido inerente ao termo, design se relaciona com desígnio, isto é, uma intenção, propósito. Desta forma, entendo que os designers têm um papel extremamente importante no que tange a desenhar/projetar novas formas de vida – de lazer, trabalho, ensino e moradia –, novas relações humanas e interações com os artefatos – materiais ou digitais – necessárias neste contexto de pandemia e fora dele”, conclui Rosana Vasques.
Por Patricia Mariuzzo



Marcelo Andriotti
12 de junho de 2020