
Professores do PPG em Ciências da Religião participam de colóquio sobre Catolicismo e secularização nas Américas
Evento ocorrido na Université Laval, em Quebec, no Canadá, se deu como parte do estágio pós-doutoral da docente Ana Rosa Cloclet da Silva
Os professores do Programa de Pós-Graduação (PPG) em Ciências da Religião da PUC-Campinas, Dra. Ana Rosa Cloclet da Silva e Dr. Douglas Ferreira Barros, participaram, nos últimos dias 20 e 21 de novembro, na Université Laval, na Cidade de Quebec, no Canadá, do Colóquio Internacional “Catolicismo e Secularização: olhares americanos (Séculos XIX – XXI)”.

O Colóquio Internacional “Catolicismo e Secularização: olhares americanos (Séculos XIX – XXI)” aconteceu como parte das atividades do estágio pós-doutoral da docente Ana Rosa Cloclet da Silva, da Faculdade de História e do Programa de Pós-Graduação (PPG) em Ciências da Religião da PUC-Campinas, e foi sediado pela Faculté de Théologie et de Sciences Religieuses (em tradução livre para o português, Faculdade de Teologia e Ciências Religiosas) da Université Laval, na Cidade de Quebec, no Canadá.
O evento, ocorrido em formato híbrido (presencial e on-line) como parte das atividades do estágio pós-doutoral (financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – Fapesp) da docente Ana Rosa Cloclet da Silva, foi sediado pela Faculté de Théologie et de Sciences Religieuses (em tradução livre para o português, Faculdade de Teologia e Ciências Religiosas) da Université Laval, instituição à qual a professora se vincula atualmente na condição de “chercheuse invité” (em tradução livre para o português, “pesquisadora convidada”).
Também docente da Faculdade de História da PUC-Campinas, Ana Rosa foi uma das organizadoras do evento ao lado do Prof. Dr. Philippe Roy-Lysencourt, da mesma universidade canadense, com a qual a PUC-Campinas selou, em 2024, um Acordo Amplo de Cooperação que prevê, dentre outras formas de colaboração científica, o intercâmbio de docentes e discentes.
Palestras
No primeiro dia do evento, 20 de novembro, a professora Ana Rosa ministrou a palestra “A Imprensa Católica e a Dinâmica Discursiva da Secularização no Brasil”. De acordo com ela, “no Brasil, a profundidade histórica, jurídica e cultural do Catolicismo permitiu que esta religião ajudasse a modelar o enquadramento institucional e normativo do Estado brasileiro, bem como a definir critérios socialmente hegemônicos e politicamente legitimados sobre o que foi historicamente considerado como religião”.

No primeiro dia do evento, 20 de novembro, a professora Ana Rosa Cloclet da Silva (à direita, a segunda ao fundo) ministrou a palestra “A Imprensa Católica e a Dinâmica Discursiva da Secularização no Brasil”.
Para compreender como historicamente o Catolicismo reproduziu este “código cristão” monopolista, influenciando a dinâmica da secularização no Brasil, a professora analisou o discurso ultramontano (conceito que designa a vertente intransigente do Catolicismo que, no século XIX, embateu-se contra os avanços da secularização e das várias formas de liberalismo) veiculado através da imprensa. Segundo Ana Rosa, esse discurso ajudou a constituir uma “semântica da exclusão”, que opunha o conceito de religião – sinônimo de Catolicismo – ao de “seitas”, “heresias” e “falsas religiões”, associados às outras crenças e práticas religiosas. Neste sentido, ela discute como a linguagem pode funcionar como mecanismo de poder, hierarquizando a condição dos sujeitos históricos no espaço público.
No mesmo dia, o professor Douglas Ferreira Barros, docente da Faculdade de Filosofia e coordenador do Programa de Pós-Graduação (PPG) em Ciências da Religião da PUC-Campinas, ministrou a palestra intitulada “Secularização e a Disputa Antimoderna pelo Espaço Público”.

O professor Douglas Ferreira Barros (ao centro), docente da Faculdade de Filosofia e coordenador do Programa de Pós-Graduação (PPG) em Ciências da Religião da PUC-Campinas, ministrou a palestra intitulada “Secularização e a Disputa Antimoderna pelo Espaço Público”.
Segundo ele, o objetivo de sua apresentação foi “analisar, a partir de uma certa leitura do processo de modernização no Brasil, como as agências religiosas envolvidas na secularização deixaram a sua marca sobre o espaço público ao longo do tempo. A minha hipótese, que por enquanto se apresenta mais como uma interrogação sobre o assunto, é que essa compreensão do processo que se desenrolou no Brasil após a Constituição de 1988 põe em questão e dúvidas a ideia de um caminho rumo à emancipação, à liberdade e à instauração de uma democracia pluralista”.
Em pauta
A professora Ana Rosa explica que o Colóquio colocou em pauta a complexidade das formas de expressão dos “catolicismos” em contextos de secularização, nas suas interfaces com a política, a cultura e as sociedades.
Ela explica que “a partir do diálogo entre pesquisadores e pesquisadoras de nove países do continente (Argentina, Brasil, Canadá, Chile, Costa Rica, Estados Unidos, Haiti e Peru), o tema foi abordado sob enfoques interdisciplinares e a partir de diferentes escalas temporais e espaciais de análise, com base em temas que colocam em questão os limites teóricos das abordagens eurocêntricas sobre a secularização, tais como: a imprensa católica, as relações entre a Igreja Católica e o Estado, o Catolicismo e a educação, o Catolicismo e o feminismo, o Catolicismo e as devoções, dentre outros. Estas temáticas pautaram os debates em múltiplos idiomas”.
Interdisciplinar e transnacional
A abertura oficial do evento foi realizada por Yves Guérrete, diretor da Faculté de Théologie et de Sciences Religieuses da Université Laval. Logo depois, houve uma introdução que situou o enquadramento do evento, realizada pelos seus organizadores: a Profa. Dra. Ana Rosa Cloclet da Silva e o Prof. Dr. Philippe Roy-Lysencourt. A coordenação de cada uma das seis sessões ficou a cargo de docentes da universidade canadense, incluindo historiadores, teólogos e geógrafos, o que, segundo a professora, “enriqueceu a discussão a partir de um tema cuja natureza é, necessariamente, interdisciplinar e transnacional”.

O doutor em História e doutor em Estudos Religiosos, Philippe Roy-Lysencourt, da Faculdade de Teologia e Ciências Religiosas da Université Laval, foi um dos organizadores do Colóquio ao lado da professora Ana Rosa Cloclet da Silva.
Selando a parceria
A professora Ana Rosa diz também que a sua participação e a do professor Douglas no evento, representando a PUC-Campinas, sela uma parceria que vem se desenvolvendo desde 2020 com pesquisadores da Université Laval, especificamente, nas pessoas do professor Philippe Roy-Lysencourt e do Dr. Gilles Routhier, especialista em Concílio Vaticano II e que também é o atual superior geral do Seminário de Quebec e membro da Société Royale du Canada. Ela explica que ambos já estiveram como professores visitantes na PUC-Campinas, em 2023, por ocasião da realização do Colóquio Internacional “História do Catolicismo no Brasil: Debatendo as Múltiplas Faces do Intransigentismo (Séc. XIX – XXI)”, ocasião em que ministraram um tópico especial no âmbito do PPG em Ciências da Religião.
Ainda segundo Ana Rosa, “deste colóquio realizado na PUC-Campinas, resultou o livro ‘O Catolicismo no Mundo Contemporâneo: Debatendo o Intransigentismo no Brasil’, coorganizado por mim e pelos professores Philippe Roy-Lysencourt e Dr. Rodrigo Coppe Caldeira, da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-Minas), que contou com o prefácio do professor Douglas Ferreira Barros, coordenador do PPG em Ciências da Religião de nossa Universidade. Em maio do ano passado, eu estive em Roma, participando do Colóquio Internacional ‘Le Saint-Siège et le Diocèse de Québec, XVIIe – XXIe Siècles’, organizado pelo professor Philippe, do qual participaram, além de Gilles Routhier, outros pesquisadores da Université Laval e de outras universidades europeias. Neste ano, o professor Philippe esteve novamente na PUC-Campinas. Ele participou do Colóquio Internacional ‘Religião, Política e Exclusão’, organizado pelo PPG em Ciências da Religião, ocasião em que também ministrou a conferência ‘A Vida e a Obra de Marie Guyard de l’Incarnation’, mística do século XVII, de cuja cátedra Philippe é o atual responsável. Dividindo a mesa com a Profa. Dra. Ceci Baptista Mariani, do PPG em Ciências da Religião, que ministrou uma palestra sobre a ‘Mística e o Feminino’, esta atividade envolveu o público discente das faculdades de História, Filosofia, Teologia e Ciências Sociais”.

A PUC-Campinas selou, em 2024, um Acordo Amplo de Cooperação com a Université Laval que prevê, dentre outras formas de colaboração científica, o intercâmbio de docentes e discentes.
A professora completa dizendo que “neste sentido, o último Colóquio realizado se situa no âmbito de uma parceria profícua entre pesquisadores do PPG em Ciências da Religião da PUC-Campinas e da Faculté de Theologie et de Sciences Religieuses da Université Laval, dando sequência a eventos e produções conjuntas, A partir deste último Colóquio, realizado em Quebec, está sendo organizada uma obra coletiva, coorganizada por mim e pelo professor Philippe”.
Sobre o Acordo Amplo de Cooperação
No último dia 18 de novembro, houve também uma reunião entre o diretor da Université Laval, Yves Guérrete, e os professores Phillippe, da mesma universidade, e Ana Rosa e Douglas, da PUC-Campinas, que tratou de assuntos de interesse comum aos dois programas de pós-graduação de ambas as instituições e projetou desdobramentos futuros da parceria, de forma a consolidar o Acordo Amplo firmado entre a PUC-Campinas e a Université Laval em 2024.
“Este acordo, a exemplo de outros firmados pela PUC-Campinas com universidades estrangeiras, sela o interesse mútuo de ambas as instituições em colaborarem através de diferentes programas de ensino e pesquisa com o objetivo de desenvolverem a qualificação de seus corpos docentes e de seus estudantes. Desse modo, ele prevê que acordos específicos possam ser futuramente selados, visando diferentes modalidades de programas cooperativos, tais como o intercâmbio de professores e de estudantes, a cotutela de orientandos, a participação em eventos científicos, o intercâmbio de documentos pedagógicos e científicos, a publicação conjunta, dentre outros”, encerra Ana Rosa.

A Université Laval é uma das maiores universidades do Canadá. Ela foi fundada em 1852 por iniciativa do Seminário de Quebec, sendo a instituição de ensino superior de língua francesa mais antiga da América e a sexta universidade mais antiga do Canadá.
Secularização e Catolicismo nas Américas
De acordo com o coordenador do Programa de Pós-Graduação (PPG) em Ciências da Religião da PUC-Campinas, professor Douglas Ferreira Barros, o programa do Colóquio visou estudar de modo mais profundo o tema da secularização e as suas repercussões no contexto da relação entre a secularização e o Catolicismo nas Américas. Quanto à relevância do evento, ele diz que esta se encontra “na reunião desses pesquisadores, que são historiadores, teólogos, juristas, filósofos, antropólogos, enfim, que são provenientes de diferentes matizes e orientações de pesquisa, e que buscaram aprofundar questões que conectam secularização e Catolicismo, a agência da religião no espaço público e a influência da religião Católica sobre os poderes políticos nos países de origem dos pesquisadores participantes”.
Ele comenta ainda que “a temática foi a mais ampla que a gente conseguiu envolver, mas a riqueza do encontro, esteve, exatamente, na multiplicidade de abordagens e de olhares acerca dos diferentes países das três Américas e do Caribe. Então, fundamentalmente, o nosso objetivo foi descobrir e aprofundar a compreensão acerca dos pontos de conexão, de tensão e de diferenciação dos diferentes processos de secularização que ocorreram nesses países após o século XIX e, em especial no século XX, mas também no presente momento”.
Ápice de um trabalho conjunto
“Para as duas universidades, a realização do Colóquio é importante porque consolida a um processo de interação e de pesquisa que vem sendo trabalhado nos últimos anos. Nesse momento, por exemplo, a professora Ana Rosa está desenvolvendo, como professora convidada, o seu pós-doutorado na Université Laval e a realização deste encontro é um passo adiante em torno deste trabalho que vem sendo consolidado em torno da secularização e do Catolicismo”, ressalta o professor.
Douglas comenta ainda que “do ponto de vista dos programas de pós-graduação de ambas as universidades e do desenvolvimento da pesquisa, o evento foi uma espécie de ápice da realização de um trabalho conjunto e da expressão da maturidade do Acordo Amplo de Cooperação existente entre a PUC-Campinas e a Université Laval, ou seja, trata-se de um trabalho de investigação que envolve não só o contexto brasileiro, mas o contexto de toda a América e a nossa intenção é congregar mais pesquisadores e, a partir desse tema, aprofundar as linhas de conexão e mantê-las como o nosso ponto de trabalho comum entre ambas as universidades”.

A Faculdade de Teologia e Estudos Religiosos da Université Laval é a única faculdade de Teologia da província canadense do Quebec.
Novas frentes de pesquisa
Ele explica ainda que “os resultados positivos desse acordo é que ele abre as portas para a possibilidade de novas frentes de pesquisa, tanto no âmbito das ciências da religião e da teologia, quanto em outros âmbitos. Isso é apenas uma porta de entrada e é muito interessante porque, durante o Colóquio, nós debatemos, exatamente, a possibilidade de outras matrizes de estudo, como, por exemplo, pela via da história, das artes ou do processo de colonização que nós, brasileiros, ou os canadenses, sofremos. Somos frutos de um processo colonizador e, na atualidade, estamos em meio a um franco debate acerca de processos de descolonização, de processos de recuperação das tradições culturais dos povos originários de diversas regiões do Canadá e de diversas religiões do país norte-americano, e esses mesmos temas, atualmente, envolvem também vários campos de pesquisa no Brasil”.
“Por fim, eu vejo que há uma porta aberta para que inúmeras ações possam ser feitas no sentido de ampliar o leque das possibilidades de investigação e tornar mais densa e qualificada essa parceria de pesquisa e investigação, que é, de fato, o verdadeiro sentido da parceria entre instituições que desenvolvem pesquisas”, encerra o coordenador do PPG em Ciências da Religião.

